sexta-feira, 30 de maio de 2008

Não TER DOM ou Não SABER VER?


Ao longo da vida, tenho deparado com várias pessoas, de diversas idades, que sempre que falamos em desenhar ou em pintar dizem não ter DOM ou não ter jeito.
Esta reacção sempre me intrigou e procurei, ao longo da minha vida profissional, estudar a razão desta descrença.
Tive alunos que, à partida, me avisavam da sua falta de jeito e faziam questão de o revelar na realização dos exercícios propostos. Quando me deram oportunidade de trabalhar, durante dois ou três anos com eles, foi possível desmistificar muito do que a acção cultural e sócio/familiar tinham formado no seu subconsciente. Foi possível ensiná-los a saber “ver” e a perder a utilização sistemática de “só olhar”. E se aprendermos a “ver” estamos a utilizar ferramentas importantíssimas que só desenvolvem as nossas capacidades mentais.
A confusão que se faz na nossa cultura…”desenhar e pintar é para artistas”!
Bebeu-se muito na família, ou nos primeiros professores que, também sem culpa, nos rotularam logo pelo nível da nossa expressão plástica.
Assim, após o ensino básico mergulha-se no esquecimento desta ferramenta , e quem sofre com isso?! - Especialmente o hemisfério direito do nosso cérebro.
O hemisfério esquerdo controla a fala e por ele ser mais rápido com “a sua tagarelice mental” convence-nos facilmente.
O hemisfério direito, atrelado aos sentimentos, é mais lento a reagir, logo é abafado nas suas pretensões.
O poder do lado esquerdo é responsável por manter uma programação mecânica de hábitos, em que se misturam a imaginação negativa, os preconceitos, os medos, as limitações. Enfim, ele mantém uma rede, desenvolvida pela própria mente, tão densa que, às vezes, a verdadeira realidade nos parece oculta e inacessível.
Se desenhar é uma ferramenta própria da linguagem do hemisfério direito, como exercitá-lo, se a maioria das pessoas pensa que a qualidade de desenhar é mágica, e que é um dom que só alguns têm!? O argumento parece contraditório, pois temos o potencial, mas não podemos exercitá-lo. Ocorre algo, assim como ter pernas e não poder andar; frente a esta conclusão devemos procurar outra explicação. Não será outro o segredo? Porque desenhar não é difícil, a questão especial é VER, ou mudar para um modo especial de ver. Ver com os olhos da mente, experimentar conscientemente a utilização do lado direito do cérebro.
Muitos artistas têm feito numerosos depoimentos sobre esta maneira especial de “ver”, que os leva a um estado de consciência em que se perde a sensação do tempo, experimentando um estado de relaxamento. Eles estão vigilantes, porém experimentando uma sensação aprazível e quase mística.

Há uns meses atrás dirigi um trabalho de grupo com pessoas bem crescidas e tive que as colocar na situação prática de desenhar e pintar. Muitas tinham esquecido a sensação de pegar num simples lápis de cor e, frente a uma folha branca, ficaram bloqueados. Passados alguns minutos, tinham ultrapassado a barreira e pareciam putos numa sala de 1º ciclo, felizes por retomar uma sensação esquecida!
Criar, sem intenção de ser artista ou compositor, o desenho, as cores e os sons são mundos a explorar para desenvolver áreas adormecidas do nosso cérebro.
Começar por aprender a “ver”, observar o que nos rodeia com pormenor, as formas mais regulares ou irregulares, a geometria na natureza, na arquitectura, a cor (vários tons que nunca vemos), a expressão de um rosto, de um corpo, de uma árvore, as tonalidades do claro/escuro e os meios tons. Depois, deixar a mão seguir o que a imaginação e a expressão desejam, sem constrangimentos e sem julgamentos…

Nota: voltarei a desenvolver estas questões noutra oportunidade.



5 comentários:

goiaba disse...

Gostei da forma como abordaste esse hábito de "olhar e não ver" ... E do "jeito para..."
Em relação à Matemática ouvi comentários do mesmo tipo, de alunos e pais. Claro que há quem tenha "jeitos" inatos que se desenvolvem de forma espontânea e qualquer pequeno estímulo permite grandes saltos. Já outros ... é preciso quem motive, quem estimule e saiba ensinar, treino e persistência do próprio . É o meu caso com as artes visuais...
Aguardo os próximos "capítulos".
Abraço vizinha

Anónimo disse...

Pois,que dizer a alguém que sabe muito bem o que diz?? Acho,acredito mesmo,que é um "dom"!
Quando tento fazer um desenho,por ex.um carro Sebastião pergunta:o que é isto, Vó? Respondo:um carro."Deixa,eu ensino". Nos seus 4 anos faz algo mais parecido...Adoro desenho, pintura,mas talvez precisasse de umas aulinhas! Ñ voltei aos estudos? Pois então? Mas entendi o q. quis dizer.Abraço.isa

Rosa dos Ventos disse...

Eu sou "das tais"...
Não tenho jeito nenhum!
Quando andava no liceu só era boa no desenho geométrico.
E tenho pena de não saber "ver"...

Abraço

ZIA disse...

Pois eu já me rendi a este desafio e está para breve o início, não direi bem de umas aulinhas mas de uns momentos passados na casa da vizinha para ver se ela tem razão e se o meu hemisfério direito ainda vai a tempo de ser estimulado, sem preconceitos nem receios...
Mi aguarda!!
ZIA

maninhalena disse...

Olá...
Foi muito giro pensar como, apesar de dizer não ter jeito para desehar, percebi que nos momentosmais felizes e serenos da minha vida consegui desenhar coisas giras...
O segredo é ser feliz! ;)
Obrigada por me recordar do meu hemisfério direito...
Beijinhos